domingo, 1 de novembro de 2009

Justiça I

Ella adormeceu em poucos minutos. Levantei-a no colo com a intenção de levá-la para o conforto de sua cama. Seu sono era profundo, mesmo assim me envolveu com seus braços, serena e tranquila. Seu semblante demonstrava o quanto seu relato aliviou parte de suas inseguranças e medos.


Quando a deitei sobre a colcha, vi Eve através da janela, debruçada na balaustrada da varanda. Seu olhar estava distante e segurava displicentemente uma garrafa de cerveja. Não tinha dúvida quanto a sua preocupação com a amiga, notei sua necessidade de relaxar logo após ouvir a dolorosa história.


Deixei a mulher amada bem acomodada, parecia em paz. Um rosto tão doce e adorável foi marcado pela violência, seu corpo subjugado ao desejo de um outro ser humano, não sei se deveria realmente denominá-lo como tal. A minha grande questão era se ele ainda gozava de liberdade.


Fui até a varanda impulsionado a satisfazer minha curiosidade natural. A artista era a pessoa mais indicada para sanar minhas dúvidas. Não poderia incomodar minha criadora com este assunto. Se ele não estivesse pagando seu débito com a justiça, não queria imaginar o sofrimento dela ao me contar.


Ao me aproximar, minha amiga me ofereceu uma cerveja dizendo ter terminado aquela, contudo poderia buscar outra na geladeira. Recusei, mais tarde experimentaria a bebida fermentada. Tinha outra prioridade.


Fui direto ao assunto:

– Afinal, o que aconteceu com este homem? Houve justiça para Ella?


Eve desviou o rosto por treze segundos. Seu olhar vagueou como as ondas do mar. Eu não compreendia o seu motivo para relutar em esclarecer o que havia acontecido com o sujeito. A princípio imaginei se ele não estaria vivendo em liberdade e aterrorizando mais alunas.


Finalmente, a artista deixou a garrafa de cerveja no chão e resolveu falar:

– Vou contar desde o início para você compreender como tudo se desenrolou. Ella deve ter ficado umas duas horas sentada nos fundos do prédio antes de se levantar. Era por volta de nove e meia da noite quando chegou com a cabeça baixa, o rosto todo marcado e o vestido rasgado.


– Me aproximei para ajudá-la, porque entrou mancando. Mal encostei nela e começou a chorar. Eu sabia que alguém a havia machucado. Seu olho roxo era obra de alguma mão pesada e estar sem óculos era algo bem improvável. Quando secou parte das lágrimas, me pediu para ajudá-la com o banho.


– Eu a levei até o banheiro e retirei seu vestido, pois não conseguia abrir o fecho sozinha. Notei que estava sem a calcinha, seu sutiã estava solto e rasgado. Eu não tinha mais dúvidas sobre o que havia acontecido a ela. Cheguei a insistir para ir ao médico antes do banho, mas como relutava muito, desisti. Ficou por mais de meia hora debaixo do chuveiro e quase tive que tirá-la à força.


– Tentei em vão convencê-la a ir ao hospital naquela mesma noite. Eu sabia que o banho tiraria evidências do que ocorreu. No entanto, não era de todo tarde para comprovar que fora agredida. Mas ela insistiu só precisar de uma boa noite de sono. Fui com Ella até o seu quarto e rapidamente se enfiou debaixo do edredom.


– Então, depois de deitada, ajeitei sua coberta e afaguei seus cabelos. Pela primeira vez recebi um meio sorriso da Ella. Antes de desmaiar de exaustão disse que não se lembrava da última vez que a colocaram na cama para lhe desejarem boa noite. Por fim, me pediu para trancar a porta antes de sair.


– Eu fiquei chocada. Achei melhor não sair do quarto dela naquela noite. Sentei na beirada da cama pensando quem poderia ter feito aquilo a uma garota tão doce. Passei toda noite chorando baixinho para não acordá-la. Pensando que se fosse comigo, estaria na delegacia prestando depoimento.


– Nossa amizade foi se fortalecendo ao longo de um mês, após seu pesadelo. Mesmo assim nunca me revelou nada sobre a tal noite. A esta altura eu sabia que havia trancado todas as matérias de robótica e largado a monitoria no laboratório. Era óbvio onde estava o facínora.


– Tinha uma conhecida que era colega de turma da Ella. Íamos às mesmas festas e chegou a comentar uma vez sobre fazer aula com a “milionária”, como a chamavam à boca miúda. Procurei por Katie no prédio de Engenharia Robótica e a encontrei saindo de uma das aulas.


– Falei com ela, expliquei mais ou menos o que estava acontecendo. Não dei muitos detalhes. Para não dar na vista... Procurei não tocar no nome da Ella, mas a garota logo desconfiou por causa do sumiço dela.


– Então, me contou sobre alguém que tinha comentado com uma amiga de uma amiga... Na realidade era uma grande fofoca sobre o tal professor Pietro. Na outra Universidade onde trabalhava houve uma denúncia de assédio de uma das alunas contra ele. Nada foi provado, mesmo assim o transferiram para a nossa Universidade.


– A Katie ia me contar mais, porém o doutorzinho saiu da sala e ela se afastou dizendo que ligava para mim depois para botar o papo em dia. Eu a conhecia o suficiente para saber que adorava uma fofoca e com certeza me colocaria a par de tudo.


– Eu não fui com a cara do tal Pietro. Me olhou cheio de lascívia, como se ele fosse irresistível e eu sua próxima presa. A partir daí, tomei muito cuidado para não cruzar com ele novamente. Era meu principal suspeito.


2 comentários:

  1. Carmita, comosempre sua historia está muito boa, não tenho comentado muito, mas acompanho sempre =D suas poses são magnificas que fazem com que a historia pareça muito mais real. Está excelente!
    Beijinhos

    ResponderExcluir
  2. Oi Soraia Raquel!
    Obrigada querida! =$
    Tenho me esforçado para fazer fotos melhores.
    E encontrar as poses certas!
    É sempre bom saber que apreciam e valorizam meu trabalho!

    bjosmil!*.*

    ResponderExcluir